Além das perdas decorrentes de feiras e aulas suspensas no início da quarentena, as agricultoras e agricultores assessorados pelo Centro Ecológico na Serra e Litoral Norte do Rio Grande do Sul enfrentam pelo menos mais duas adversidades: a estiagem que aflige o Estado e o aumento no preço dos insumos.
“Ficamos um tempo sem produzir porque quando secaram os açudes, não tinha como”, lamenta Sandra Campagnollo, de Ipê. Nas contas da agricultora, desde novembro choveu no máximo quatro vezes. “Estou perdendo muita produção, por exemplo alface, fui plantar, ela não morreu, mas não conseguiu crescer”. Volmir Campagnollo, irmão de Sandra e colaborador da Cooperativa de Produtores Ecologistas Econativa, estima que entre 80 e 90% dos açudes secaram, e, sem poço artesiano, algumas famílias tiveram dificuldade de água até para beber.
Apesar de ter dois açudes, estufa, irrigação e uma boa nascente, Jonas Tondello, da comunidade de São Roque, em Antônio Prado, classifica este período como “atípico”.
“Um ano em que a gente sofreu muito. A gente foi muito afetado, todos foram muito afetados”. Além de perdas no feijão, os cultivos de batata baroa e milho tiveram cerca de 30% de perda na produção. Para quem estranha a ausência das cenouras nas feiras ecológicas, eis a explicação: “A gente perdeu bastante cenoura também. Deixou de semear por causa da seca, então agora ela já está em falta”.
No Litoral Norte, as hortaliças da família Martins, na comunidade de João 23, em Torres, também padecem com a falta de água. “Com o cultivo da cenoura a gente não conseguiu avançar, a batata doce não conseguiu crescer tanto e a própria moranga abortou algumas flores e aí produziu menos”, observou Joaquim Martins. As hortaliças da família Fernandes, na comunidade de Raposa, em Três Cachoeiras, estão enfrentando dificuldade porque precisam de muita irrigação. “Nossas águas aqui secaram. Outras culturas maiores, como o inhame, a gente não conseguiu produzir, porque precisava de uma irrigação maior e nós até plantamos, mas não produziu nada”, contou Paulo Fernandes.
Cestas permanecem mesmo com retorno das feiras
Em relação às outras famílias, a produção dos Pontel, de Antônio Prado, conseguiu atravessar bem o período de seca. Já a comercialização foi impactada. “Foi um pouco crítico, mas a gente tem uns reservatórios de água bons e pra nós não deu prejuízo nas culturas. Foi mais a pandemia”, avalia Eduardo Pontel. O agricultor percebeu que, mesmo com o rápido retorno, depois de um ou dois sábados suspensas, as feiras da Rômulo Teles e José Bonifácio (Feira do Agricultor Ecologista) em Porto Alegre estão vendendo menos. Por isso até hoje a família está levando, de caminhão, cestas encomendadas pelos clientes. “Pararam bastante as vendas, porque o povo não sai de casa, mas a gente tá levando”.
Se nas feiras o movimento diminuiu e nas escolas parou, nos minimercados, lojas de produtos naturais e mesmo nos supermercados, como a Rede Zaffari, o consumo aumentou. “Tem bastante gente nova procurando orgânicos. Feirantes deixaram de ir à feira, então a venda nos mercadinhos aumentou”, avalia Volmir Campagnollo. O colaborador da Econativa atribui à crescente preocupação com a saúde o interesse pelos produtos agroecológicos. “Tem um apelo maior pela alimentação orgânica, aumenta a imunidade. Corpo forte, doença fraca”.
Em relação aos insumos, Jonas Tondello relata que alguns, como a semente de cenoura, chegaram a dobrar de preço, assim como calda sufocálcica e cobre, entre outros permitidos na agroecologia. No entanto, o entendimento geral dos feirantes agroecológicos é segurar os preços para o consumidor. Assim, produtos sofreram como tomate e batata baroa subiram não mais que 15%, mas batata doce, feijão e verduras continuam no mesmo valor. “Até por essa questão de coronavírus a gente decidiu em reunião não aumentar os preços, porque a crise ela não vem só pra nós, por causa da seca, mas veio também na cidade”.
Fonte: Centro Ecológico / Fotos: Instagram da Feira Ecológica do Bom Fim