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Acidente com balão expõe falhas graves na formação de pilotos e na fiscalização

por Melissa Maciel
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O acidente com um balão em Praia Grande, no Sul de Santa Catarina, no último sábado (21), que resultou na morte de oito pessoas, reacendeu uma discussão recorrente. Como são formados os pilotos de balão no Brasil e quais normas regulamentam esse tipo de voo?

A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) afirmou em nota, na terça-feira (24), que o piloto responsável, Elves de Bem Crescêncio, não possuía a Licença de Piloto de Balão Livre (PBL), exigida para operações de transporte aéreo regular de passageiros. O piloto, conforme nota de seu advogado, possui uma licença RBAC 103 para voo aerodesportista. Além disso, o balão envolvido no acidente não era uma aeronave certificada.

Diante do cenário, surge a pergunta. Como alguém se torna piloto de balão no Brasil? E por que ainda há operações comerciais sem a devida regulamentação?

Conversamos com o piloto licenciado PBL, Giovani Pompermaier, que tem 20 anos de experiência e é o atual vice-campeão brasileiro de balonismo. Ele explicou as duas principais formas de se tornar piloto no país:

1. Piloto com Licença de Balão Livre (PBL)

Essa é a formação regulamentada pela Anac. Para obtê-la, é necessário realizar pelo menos 16 horas de aulas teóricas e práticas em uma instituição autorizada. Atualmente, o único centro credenciado pela Anac para formação de pilotos de balão no Brasil é o Centro de Instrução de Aviação Civil (CIAC), em São Paulo.

Após o treinamento, o candidato passa por prova teórica e checagem de voo. Aprovado, recebe a licença PBL, que permite voos privados e, em algumas situações, atuar como instrutor. Esses pilotos operam balões com prefixo PP (privado), os quais têm certificado de aeronavegabilidade experimental, inspeções regulares e seguro obrigatório.

2. Piloto Aerodesportista – Formação simplificada via associações

Para se tornar um piloto aerodesportista, o processo é muito mais simples: basta se cadastrar, via site, em uma das três associações credenciadas pela Anac (CBB, CAB ou ADB), realizar uma prova online e pagar uma taxa. Tudo é feito de forma remota, sem aulas práticas obrigatórias.

Esses pilotos só podem realizar atividades desportivas, conforme o Regulamento Brasileiro de Aviação Civil (RBAC) 103. As aeronaves utilizadas são os balões com prefixo BR, que não possuem certificação de aeronavegabilidade, não passam por inspeções obrigatórias e não têm seguro. Além disso, um balão prefixo BR não está autorizado a sobrevoar áreas populacionais.

Conforme a RBAC 103, sobre regras de operação, item (e), afirma que: “Uma pessoa somente pode embarcar outra pessoa em veículo ultraleve ou em balão livre tripulado sob este regulamento se essa pessoa estiver ciente de que se trata de atividade desportiva de alto risco, que ocorre por conta e risco dos envolvidos, onde operador e aeronaves não dispõem de qualquer qualificação técnica emitida pela ANAC, não havendo, portanto, qualquer garantia de segurança.”

“Hoje, um piloto pode conseguir autorização para voar um balão sem nem mesmo ter colocado os pés em uma aeronave antes. Isso é um absurdo. O processo precisa ser mais rígido, principalmente se envolve vidas humanas”, alerta Giovani Pompermaier.

A falta de regulamentação

Segundo a Anac, não existem balões homologados para transporte comercial de passageiros no Brasil. As operações como as realizadas na região são enquadradas como atividades aerodesportivas, mas na prática funcionam como voos turísticos pagos, o que é proibido por lei.

Esse descompasso entre o que diz a legislação e o que ocorre na prática escancara falhas graves na fiscalização. A Anac não supervisiona diretamente os pilotos com formação RBAC 103. Essa responsabilidade recai sobre a Polícia Civil, que frequentemente não possui preparo técnico para avaliar a segurança de um voo.

A maioria dos balões utilizados em operações comerciais no Brasil são do tipo BR, produzidos por fábricas nacionais que seguem padrões técnicos e contam com projetos desenvolvidos por engenheiros especializados. Embora ainda não possuam homologação oficial, esses equipamentos passam por processos de fabricação criteriosos e são reconhecidos por sua qualidade, comparável à de balões fabricados no exterior. No entanto, a formação de pilotos pelo RBAC 103 ainda é considerada simplificada em relação à dos licenciados com PBL.

O que precisa mudar?

É urgente regulamentar os voos comerciais e fortalecer a fiscalização, com atuação conjunta da Anac e das autoridades policiais. Também estabelecer regras claras para a operação comercial de balões no Brasil.

Enquanto medidas efetivas não forem implementadas, tragédias como a de Praia Grande correm o risco de se repetir em qualquer lugar do país. O balonismo no Brasil precisa ser encarado com responsabilidade e seriedade, antes que novas vidas sejam ceifadas por falhas que poderiam ser evitadas.

Regiões com grande potencial turístico, como as cidades do Litoral Norte gaúcho e do Sul catarinense, correm o risco de perder espaço nesse mercado promissor devido à negligência, ao descumprimento da legislação vigente e ao uso da ausência de regulamentação e fiscalização como brecha para práticas irregulares.

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